Não há momento mais
conveniente que esse para levantar a questão sobre o socialista de iPhone. Boa
parte da população vive intensamente os acontecimentos oriundos da crise no
governo brasileiro e se por um lado fala-se muito sobre políticos e suas ações
na prática, por outro lado fala-se pouco sobre as filosofias políticas de
opositores e apoiadores do governo.
É errado um socialista ter um iPhone? Certamente não! Mas a crítica não se limita a isso. O socialista de iPhone representa um estilo de vida elitista. Ele não é somente um possuidor de smartphone, ele é um entusiasta do Netflix, Spotify, Uber, Snapchat, Facebook, Instagram, festivais de música, bons restaurantes e bons drinques que, na primeira oportunidade, levanta bandeiras anti-mercado. Isso é, no mínimo, contraditório.
Eles poderiam dizer que o Marx nunca disse que devemos fazer voto de pobreza - e isso é verdade - mas o mesmo barbudo falou exaustivamente sobre os males do fetiche a mercadoria. Outros dizem que o avanço tecnológico é inevitável e natural. Ou, como disse Cynara Menezes "no socialismo, todos terão iPhone". Afirmações como essa (e o determinismo histórico em geral) são tão passiveis de confirmação quanto a ida ao paraíso e encontro com sete virgens.
O maior erro de julgamento da esquerda é achar que a igualdade social é a solução para os pobres enquanto ela ignora não só o histórico de tentativas socialistas como rejeitam a ideia da geração de riqueza como um fator fundamental para evolução da sociedade. Seus discursos me fazem pensar que durante mais de 5 mil anos o mundo era perfeito. Que, com mais de 90% da população vivendo nas mesmas condições e sem capitalismo, a felicidade reinava na Terra.
Na pratica, não importa o quanto de riqueza foi gerada nos últimos 200 anos, o quão popular se tornaram produtos, serviços e tecnologias antes limitados a poucos, quanto - em geral - a sociedade evoluiu em níveis econômicos e sociais ou quanto as condições de trabalho nunca foram melhores. A esquerda é categórica: A desigualdade é terrível, o sistema capitalista é o maior problema do século XXI.
Partindo, portanto, do princípio de incapacidade do capitalismo e do mercado em contribuir para a evolução da sociedade, a esquerda defende o Estado como instituição fundamental e única para exercer a justiça social, não importa se essa instituição é responsável por guerras e escravidões durante milênios.
Não há crédito e elogios aos empreendedores que hoje nos fornecem produtos e serviços que há 20 anos jamais imaginaríamos usufruir. Preferem, por exemplo, falar de como o Estado luta para frear a destruição do meio-ambiente causada pelo capitalismo ao invés de entender que o iPhone, que além de um simples telefone substituiu o uso de calculadora, bloco de notas, relógio, lanterna, agenda, etc., economizou mais recursos naturais que qualquer ação do Greenpeace.
Há quem não vê contradição em ser um socialista de iPhone. É aquele grupo que abraça rótulos que em princípio são contrários a ideologia que defendem. Não ligam em ser a esquerda caviar. Não ligam em dizer "aquecimento global" e depois mudar a pauta para "mudanças climáticas". Não ligam em defender golpes chamando opositores de golpistas. Não ligam em vestir a camiseta de um assassino. Eles são os articuladores que entenderam que não há uma luta de classes e sim uma luta semântica e midiática. Que não importa o que fazem, mas sim o que falam. Eles estão na frente nesse quesito pois levam a sério a máxima que uma mentira repetida mil vezes se torna uma verdade. Não são hipócritas por isso, são cínicos.
Lanço um desafio a esquerda: Que tal, parar de chamar todo mundo de fascista e falar que isso é "mais amor"? Que tal, genuinamente se interessar por melhorar as condições econômicas das classes mais baixas através de uma sociedade mais livre? Que tal, admitir que o estado e corporações amigas são parceiros e pisam na população de cima para baixo e não da direita para a esquerda? Que tal, admitir que o mercado proporciona coisas ótimas e que um governo jamais seria capaz de prover?
Nada mais normal que querer usufruir de todas as tecnologias disponíveis. Só não seja um cínico.